terça-feira, 18 de setembro de 2007

A História bem na Foto - 5 > Conteúdo

Neste A História bem na Foto - 5 >


Sergio Araujo > Pulo para a morte
Gilson Barreto > O prédio cai
Walter Firmo > Um santo enternecido
Cristina Zappa > Na alma
Luiz Morier > Todos negros

Acesse aqui a série completa:
A História bem na Foto - 8
(veja ao final a relação dos participantes).

Este blog segue o padrão “livri”, ou seja, tem número limitado de postagens
e é editado para leitura de cima para baixo.
Outros blogs complementares poderão ser editados.

Foto do título: Bandeiroso, Aguinaldo Ramos, 2001

Sergio Araujo > Pulo para a morte

A foto é a do pulo para a morte de uma senhora durante o incêndio do edifício Andorinhas, no Rio de Janeiro, em 1986. A foto foi feita com uma Nikon FM com motor (é só o que me lembro).
A foto foi feita no pátio interno do edifício para onde davam várias salas.

Eu estava presente no incêndio meio que por acaso. Estava na redação do Jornal da Vale, alguns metros distante, entregando material, quando vi a fumaça que saía do prédio. Fiz algumas fotos dali mesmo e me dirigi ao local. Lá chegando vi o desespero de todos, a confusão generalizada e vi esse pátio interno, que me pareceu um bom lugar para fazer algumas fotos, sem imaginar ainda o drama que iria viver ali. Para chegar lá tive que entrar correndo e me desviando dos detritos no chão, pois pedaços de janelas e vidros quebrados caiam sem parar. Lá chegando vi várias pessoas penduradas nas janelas, procurando ar para respirar e um lugar para fugir do calor pavoroso que fazia nas salas incendiadas.

Num andar mais alto havia duas pessoas numa das janelas: um senhor deitado que quase não se mexia, apenas acenava e uma senhora que estava de pé no parapeito, aguardando a chegada do socorro. De vez em quando ela fazia menção de pular, acenando para que as pessoas se afastassem. Todos os que lá estavam pediam para que ela não pulasse, se acalmasse e esperasse pelos bombeiros. Foram momentos angustiantes com a expectativa de que ela, não agüentando o calor, pulasse.
Quando o carro dos bombeiros, com a escada Magirus, chegou, achei que o drama iria finalmente acabar, mas a escada não alcançava o andar onde a senhora estava (creio que 12º) e ela, sem mais esperanças, pulou para a morte.

Foi uma comoção geral. Até mesmo para os policiais e repórteres fotográficos acostumados a acompanhar tragédias.
Nesse momento, em que ela pulou, acionei o motor da câmera e vim acompanhando a queda fotografando toda a seqüência do pulo, mas não consegui fazer a última foto, a da queda no chão, pois nesse momento, parei de fotografar e chorei, como muitos dos que ali estavam.
Até hoje relembrando esses fatos ainda me emociono.
O senhor que estava lá com ela, no 12º andar, deitado, aos poucos foi parando de acenar até que não agüentando as queimaduras e a falta de ar, morreu.
A pressão psicológica era imensa, como é fácil de se deduzir, e só fiquei fotografando porque nada mais poderia fazer para resolver aquela situação. Nada dependia de mim e o que eu poderia fazer era registrar esse momento.
Não estava submetido a nenhuma pressão profissional, pois eu não trabalhava para nenhum órgão de imprensa e estava ali por minha conta. Fiquei fotografando a tragédia, apesar de muito abalado, pois sou fotógrafo. É isso que faço.

Após a queda da senhora, continuei fotografando o incêndio e principalmente a movimentação dos bombeiros, que são verdadeiros heróis, apesar de não se mostrarem preparados para um evento desse porte. Inclusive em relação ao material e condições de trabalho, com várias mangueiras furadas e com falta de água nos hidrantes.
Na hora não tinha consciência de nada. Trabalhei no instinto, sem pensar no que faria com aquele material. Toda escolha feita, técnica, estética, psicológica foi puramente instintiva. Você usa o que você sabe, sem atentar para isso. Pelo menos eu, e nessa situação de pressão.
Esse material que produzi foi encaminhado para a agência de fotojornalismo Fotossíntese, pois eu não saberia como colocar esse material, que o apresentou para os veículos de comunicação. Depois desse evento e motivado por ele, passei a fazer parte dessa agência, como um de seus sócios.

A foto foi primeira página em vários jornais. Eu consegui a foto que os fotógrafos dos jornais não conseguiram. Foi primeira página no JB, O Dia, Tribuna da Imprensa, Estado de São Paulo, Folha, entre outros, e também foi veiculada no exterior, através da agência France Presse.

O Corpo de Bombeiros, através de seu departamento de Relações Públicas, procurou a agência Fotossíntese e pediu para ver o material. Então, perguntou se eu poderia ceder uma série das fotos para que pudessem servir de material nas palestras e cursos internos dos bombeiros. Eles constataram nas fotos algumas atitudes que poderiam ser corrigidas e gostariam de ter esse material para isso.
Claro que concordei e cedi o material.
Eu realmente não sei se a foto é, ou continua sendo, histórica. Depois do fato passado, eu achei que as fotos poderiam contribuir de maneira eficiente na correção dos problemas e dificuldades que os bombeiros enfrentam num desastre dessa proporção. Também achei que devido ao alto grau de emoção da imagem ela poderia servir para alertar as pessoas sobre os perigos da falta de manutenção dos equipamentos de combate a incêndios e sobre os procedimentos errados que eram/são feitos na prevenção de incêndios.
Um fato que mostra bem o que é a indústria, mesmo diante da tragédia, e que influencia o profissional até na escolha do material é que se eu tivesse feito a foto em cor, ela teria sido vendida muito mais, pois as agências internacionais e os veículos do exterior telefonaram para a Fotossíntese interessados em comprar a foto, mas queriam material em cor.
Por mais chocante que possa ser (e é), o profissional tem que manter um afastamento do fato e lidar com essas escolhas.
No que essa foto, mudou minha vida?
Profissionalmente, passei a ser mais considerado pelos colegas. No jornal da Vale, por exemplo, nessa época eu fazia parte dos fotógrafos que não viajavam para fazer matérias em outros estados, que só faziam o material local. Depois da foto, entrei para o time dos que viajavam. Passei no “teste”.
Pessoalmente, foi uma foto que me marcou muito. Durante muito tempo a lembrança do corpo caindo e do barulho da queda ficou na minha cabeça. É uma experiência traumatizante você ver alguém morrer na sua frente.

Sergio Araujo > Depois de quase ter sido advogado, formei-me em música e fui para a França fazer um curso de composição eletroacústica e pedagogia musical. Voltando ao Brasil, criei e apresentei alguns programas de rádio e finalmente virei fotógrafo.
Como fotógrafo comecei trabalhando com Albino Pinheiro, fazendo as fotos do show Seis e Meia, no teatro João Caetano e sendo, por alguns anos, o “fotógrafo oficial” da Banda de Ipanema. Fotografei para a ACET onde fiz fotos para programas, divulgação e cartazes de várias peças teatrais.
Sempre como free-lancer, trabalhei para a revista médica “Diálogos” do laboratório Roche e para o jornal interno da Cia. Vale do Rio Doce.
Em 1986 entrei para a agência de fotojornalismo Fotossíntese, onde prestei serviços para quase todos os órgãos de imprensa do Rio e de São Paulo, entre eles: Veja, Isto É, Manchete, Folha de São Paulo, Estado de São Paulo, Tribuna da Imprensa, O Dia, JB, entre outros.
Após alguns anos, resolvi abrir um estúdio e partir para a foto publicitária, área onde me encontro até hoje.
Como fotógrafo de publicidade, já trabalhei para quase todas as agências do Rio e ganhei vários prêmios.
Como fotógrafo de arte, já participei de mais de 20 livros.

Gilson Barreto > O prédio cai

No dia 02/09/1982, na Rua Fagundes Varela, Niterói, RJ, um prédio pronto, faltando apenas o habite-se, ruiu.


Era, na época, anunciado como o melhor de Icaraí, sendo que mais de quarenta apartamentos, de um total de cinquenta e seis unidades, já estavam vendidas. Mas, a má execução da obra, aliada à negligência da firma, levaram ao esmagamento de pilares, o que ocasionou a queda de um prédio de vinte andares.

Cheguei no local do acidente às 15:45h. Todos os jornais estavam lá desde cedo, alguns até com duas equipes, e os jornalistas cada vez se aproximavam mais do prédio interditado. Nesta hora, o responsável pela Defesa Civil, Frederico Behen, gritava, histérico, “saiam, saiam, saiam, porque o prédio vai cair!”. Nós nos afastávamos, mas logo em seguida voltavam todos.


Nesse momento o prédio estalou, todos correram, alguns para a parte alta da rua e outros para a parte baixa, sendo que eu corri para baixo. Logo em seguida todos voltaram, quando, sem outro aviso, o prédio caiu.


Só o Jornal do Brasil publicou a sequência do prédio caindo, eram 16:15h.

Coisas que aconteceram depois:
1) Ribeirinho, fotógrafo da Última Hora chegou na redação e disse que tinha feito a queda do prédio sozinho. No dia seguinte, o jornal publicou só a foto da poeira, com uma tarja “exclusiva”. Quando ele chegou para trabalhar, nem subiu: estava demitido;
2) A foto do Jornal O Fluminense era só poeira e eu aparecia na foto;
3) O cabo-man da TV Globo se assustou, correu e desligou a camera. Então, a TV Globo ficou sem o registro da queda do prédio;


4) Alberto Ferreira, Editor de Fotografia do JB, foi para a redação e quando voltou para a fotografia entrou gritando que ninguem tinha feito;

5) Chico Caruso, no dia seguinte, publicou uma charge intitulada "É melhor sair daí", usando toda a seqüência fotográfica, mas sem dar o crédito. Houve, então, uma grita geral, todos reclamaram. Pouco tempo depois o fotógrafo Delfim Vieira foi para o Nordeste, onde fotografou um morador local comendo um calango (foto que se tornou famosa) e Chico Caruso fez uma charge sobre a foto de Delfim Vieira, colocando, o que em geral se repete até hoje, o crédito.

Gilson Barreto > Comecei como repórter-fotográfico em 1970, na sucursal de O Dia em Niterói, acumulando, em seguida, com O Fluminense. Depois, fui para o Rio, onde trabalhei na Editora Abril, na Última Hora, na Tribuna da Imprensa e na TV Globo, até entrar para o Jornal do Brasil em 1982, aonde fiquei até o final de 1989.
Passei então a trabalhar na sucursal Rio do Estadão, mas acabei retornando a O Dia em 1992, quando ocorreu a reformulação do jornal. Em 1994, sofri um acidente com fratura exposta tíbia e do perônio, cuja recuperação levou dois anos e daí me aposentei.
Atualmente, sou free-lancer, trabalhando para empresas.

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Walter Firmo > Um santo enternecido

UM SANTO ENTERNECIDO

Era, mais uma saída, daquelas que qualquer fotógrafo que trabalha na imprensa em geral, seja em jornal ou revista, agradaria fazer, principamente por tratar-se de um autor forjado no seio do povo brasileiro e, por isso mesmo, lapidado nos quintais iluminado dos subúrbios carioca, naqueles tempos em que esses recantos emoldurariam para sempre um memorial livre, solto e feliz na criança que se transformasse mais tarde em adulto.
Uma saída, por si só, mágica. Seu personagem maior atendia pelo nome de Pixinguinha, um gênio da musicalidade pátria, o Alfredo da Rocha Vianna Júnior, conhecido assim na pia batismal. Compositor, maestro, instrumentista, professor, formador de importantes conjuntos e orquestras, que compôs para filmes e revistas, e tambem música litúrgica, um inovador em cada época e um santo constantemente enternecido com a geração que acredita num som brasileiro e universal.
Eu trabalhava, então, na revista Manchete, de Bloch Editores, semanário florido de fotos e pouco texto, que (dizem!...) fazia a festa nos consultórios médicos, enquanto seus pacientes, aguardando seu encontro clínico, folheavam sem muita saída, suas páginas repletas de signos e informações ligeiras sem consistências. Eu e Muniz Sodré, solerte repórter que começava sua carreira de escriba e, que, se não me engano fazia naquela saída o seu "debut", indo comigo entrevistar "aquele que pra morrer, foi pedir benção a seu santo", segundo o poeta e também compositor, Hermínio Bello de Carvalho.
E, chegando à sua casa, em Ramos, numa rua com o seu próprio nome, entreguei o mestre Pixinguinha ao Muniz, e os dois, na sala do músico, puderam, então, remexerem-se na entrevista, solitariamente. Afastando-me, percebi os acenos descontraídos da residência. Lá estava um quintal cimentado, entubado por uma vistosa mangueira, vitoriosa e soberana, a enfunar-se galhardamente em seu vertiginoso crescimento, folheada de verde, ostentando alguns frutos tímidos que cresciam esperando dezembro chegar.
Era início de setembro e a propalada primavera já se anunciava, com seus dias de sol agradável pregado no azul de um céu sem nuvens. Havia, plantadas aos pés da mangueira, dálias e rosas, salpicando dessa forma, um lirismo impressionista, cujos matizes frios e quentes, pincelavam certa quietude anunciando que a felicidade estava ali e, que Pixinguinha se emolduraria muito bem plantado naquele recanto de ordem e paz.
E, assim, uma hora depois de terminada a conversa entre o repórter e o maestro no interior da casa, convidei Pixinguinha a sentar-se em sua cadeira de balanço no meio do quintal mágico, segurando o saxofone, divisando hipoteticamente uma linha do horizonte, tocando com os olhos o silêncio de um choro ausente, mas, comovido. Lembro-me, que fiz, num raio de 160 graus, um filme de 36 poses em dois a três minutos, um delírio! Colírio para a história cultural brasileira, certeza que consagrava definitivamente, sob minhas lentes, aquele que há muito tempo já era uma lenda nacional.

Rio de Janeiro, Setembro de 1968. Câmera Nikon, 35mm, filme Ektacrome.
Comentários:
A fotografia é histórica por tratar-se de um gênio musical brasileiro.
A foto se manterá indelevelmente histórica pelo apreço e unanimidade pessoal em que as pessoas tem este autor musical.
Sou um homem de projetos pessoais e, mesmo no tempo que trabalhei em jornal e revistas, fui um declarado criador, manipulando e criando atmosferas, sustentando que a verdade jornalística, enquanto notícias, pode ter alguns lados de verdade, não somente a verdade objetiva. Na verdade, fui um criador de alegorias.
Walter Firmo > Cronologia: 1937 - nasce Walter Firmo Guimarães da Silva; 1957 - Começa sua vida profissional no vespertino "Última Hora"; 1963 - Prêmio Esso de reportagem no "Jornal do Brasil", escrevendo o texto "100 dias na Amazonia de ninguém", série de 6 reportagens; 1964 - Revista "Realidade", em São Paulo; 1966 - Revista "Manchete"; 1968 - "Bureau" de Bloch Editores, na cidade de New York; 1971 - Verbete da Enciclopédia Britanica; 1974 - Revista "Veja", sucursal no Rio de Janeiro; 1979 - Revista "Tênis Esporte", São Paulo; 1980 - "Free-lancer"; 1984 - Revista "Isto É", sucursal no Rio de Janeiro; 1985 - Diretor do Instituto Nacional da Fotografia; 1986 - Prêmio "Golfinho de Ouro", oferecido pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro; 1991 - Inicia-se como professor dando cursos, palestras, "work-shops" em todo o Brasil; 1999 - Bolsista, habita a cidade de Paris, na Cité International des Arts; 2004 - Condecorado "Ordem do Mérito Cultural", Comendador da República, prêmio outorgado pelo Ministério da Cultura e entregue pelo Presidente da República, Luiz Ignácio da Silva; 2005 - Lançamento do livro "Firmo", pela editora Bem-te-vi, na cidade do Rio de Janeiro

Cristina Zappa > Na alma

Não me lembro o dia, nem o ano. Só lembro que fui à casa de Darcy Ribeiro para fotografá-lo.
Chegando lá, depois de um cafezinho e um longo papo de Darcy com a repórter, comecei as fotos. Com a máquina focada nele, fui tirando várias fotos e, num dado momento, Darcy se levantou e me disse:" venha, se aproxime, mais perto, bem perto!". Click.
Foi olho no olho; foi na alma. É essa a última imagem que tenho de Darcy: uma imagem íntegra, sincera. A imagem de um homem que não tem o que esconder, por mais próximo que você esteja dele.
Credito a fotografia a mim e a direção, a Darcy Ribeiro.




Cristina Zappa > nasceu em 1956 na cidade de Vassouras, Rio de Janeiro.
Quando ainda estava na faculdade de Letras da PUC, no anos 70, se interessou por fotografia, ao fazer um curso na Escola de Artes Visuais do Parque Laje.
Trabalhou como repórter fotográfico no Jornal no O Globo no anos 80 e, como free-lancer, nas Revistas Veja e Exame. Além disso, também fotografou para jornais e revistas de empresas, tais como: Bayer do Brasil, Indústria Farmacêutica Roche, Telerj, Banco Nacional, Vale do Rio Doce, IBGE etc.
Atualmente trabalha como assistente de coordenação na Reserva Técnica Fotográfica do Instituto Moreira Salles no Rio de Janeiro.

Luiz Morier > Todos Negros

Trechos do depoimento de Luiz Morier, gravado em 11/05/2007, a respeito de sua foto intitulada por ele "Todos Negros".

Quando eu fiz esta foto, eu estava passando pela Grajaú-Jacarepaguá, e, passando pela estrada, percebi que havia uma blitz. Parei e fotografei a blitz. E me deparei com esta cena, os negros todos amarrados pelo pescoço. E até dei o título da foto de “Todos Negros”. E logo em seguida eu fui embora, e mais abaixo tinha uma manifestação dos moradores, eu continuei fazendo a seqüência e tal, e fui embora.
E essa me trouxe meu primeiro prêmio Esso na minha carreira. A sensação que eu tive foi de humilhação. Senti uma cena humilhante. As pessoas humilhadas, pessoas com carteira de trabalho na mão, dava para perceber que não eram bandidos, porque bandidos não usam um tipo de veste assim. É claro que eles se vestem bem melhor que isso. Eram pessoas simples, humildes, todos negros. Senti que era um ato de humilhação. Estavam sendo humilhados ali, carregados pelo pescoço como escravos.




- Do material que você fez nesse dia, você tinha certeza de que esta foto tinha destaque em relação às outras?

Não, não tinha certeza, não. Porque a gente... Eu, pelo menos, sempre... Você faz uma foto na hora, aí você só vai ter uma idéia depois que ela foi revelada. Quando eu estava revelando, sim. Aí, que eu vi a foto revelada, eu falei: “pô, essa vai dar o que falar!...” Que isso não é coisa que possa acontecer com o ser humano nos dias de hoje. Ou na época, na década de 80. Mas, até hoje a gente vê humilhação por aí...
Percebi que houve uma reação grande de todos que viram a foto. Até hoje, até hoje...
Quem ainda não viu e vê a foto... Já foi usada por várias faculdades, já foi tema... Inclusive foi, até, em 1988, quando a escravidão... Fez cem anos da Lei Áurea, ela foi bem revista e colocada para todos verem que cem anos depois ainda havia esse tipo de cena. (...)
Eu percebi que tinha uma blitz, mas eu parei porque tinha um camburão parado na pista. Eu fui lá dentro do mato fazer esta foto aqui. Então, eles estavam praticamente escondidos. Quer dizer, eu cacei!... Não estavam expostos assim, na rua. Você pode ver que tem mato lá no fundo, estavam lá no meio do mato, um caminhozinho no meio do mato. Então, quer dizer, era mais escondido, de uma forma... Eles faziam as mutretas, faziam tudo que tinham que fazer, mas, mais escondidos, para que a imprensa não visse mesmo. Agora, eles não estão nem aí... Agora, é tiro pra cá, é tiro pra lá, caiu ali, se tiver fotografa, se não tiver...

- Nessa foto aí, os PMs tiveram alguma reação de não deixarem você fotografar?

Ah, a reação foi imediata!... O tenente falou: “recolhe, recolhe, recolhe!”. Quando ele percebeu que eu estava fotografando, ele mandou recolher. Só que quando ele mandou recolher, ele não percebeu que eu... O guarda não percebeu que eu estava fazendo uma foto dele. Eu estava com um grande angular, ele achou que eu estivesse fazendo só os presos. E, no entanto, ele estava enquadrado na foto. (...)
Tem a importância que tem hoje porque mostra uma autoridade, ali, que devia usar algemas, no mínimo, e usou uma corda, e amarrada no pescoço. Não foi nem nas mãos, foi no pescoço. Quer dizer, um ato escravo mesmo! (...)
Sim, agora é. Para mim, ela é uma foto histórica. E vai estar sempre no primeiro lugar, pra mim, porque é uma foto que marcou muito esse meu tempo de trabalho.

Luiz Morier > Diz que foi no Jornal Tribuna da Imprensa que tudo começou. Aos seis anos, acompanhava o pai, Max Morier, repórter esportivo já falecido, e meio que um fundador da Tribuna. Morier começou a carreira de repórter-fotográfico no extinto jornal Última Hora, em 1977. Também teve passagens pelo Globo e trabalhou como freelancer no Estadão. No Jornal do Brasil trabalhou mais de 25 anos. Nos últimos anos tem frilado para várias empresas.

Fontes: versão digital do Jornal Paparazzi, ARFOC, Associação dos Repórteres-fotográficos e Cinematográficos,
http://www.arfoc.org.br/paparazzi/default3.asp?idperfil=18&idedicao=12&v=s,
e sessão Em Foco, ABI online, Associação Brasileira de Imprensa,
http://www.abi.org.br/paginaindividual.asp?id=412.

Série A História bem na Foto

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A História bem na Foto >
"Depoimentos exemplares": Antonio Andrade e Campanella Neto
Depoimento do autor, Aguinaldo Ramos

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Georges Racz > O nascimento de uma paixão
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Januário Garcia > Marcas do tempo
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